À medida em que a pandemia do novo coronavírus (Sars-CoV-2) avança em todo o mundo, especialistas publicam novas diretrizes para o tratamento de pacientes oncológicos. A revista científica The Lancet Oncology divulgou um artigo em que resume as orientações das principais sociedades médicas internacionais, recomendando, quando possível, a redução de atendimentos presenciais; o uso de recursos tecnológicos, como a telemedicina; a substituição de terapias intravenosas por orais; além da importância do apoio aos pacientes e do controle de infecções.
Recentemente, a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) publicou uma recomendação técnica na revista científica Brazilian Journal of Oncology sobre como adaptar as diferentes fases do tratamento do câncer de mama em tempos de pandemia, quais exames, cirurgias e tratamentos podem (ou não) ser adiados e em quais situações isso pode ocorrer, visando ajudar oncologistas, mastologistas e ginecologistas na melhor condução dos pacientes.
Para o médico oncologista Gilberto Amorim, membro do Comitê de Tumores Mamários da SBOC, o objetivo foi escrever uma recomendação adaptada para a realidade brasileira na rotina do atendimento do câncer de mama. “Abordamos diagnóstico, tratamento e o acompanhamento, qual paciente que precisa ou não fazer biópsia, não deixando de avaliar os casos metastáticos”, explica.
Ele lembra que existe uma grande quantidade de pacientes em tratamento oncológico com doenças metastáticas, como no caso do câncer de mama. “Não dá para simplesmente suspender o tratamento e pedir para voltar daqui a dois meses. As recomendações técnicas ajudam os médicos que estão nessa angústia se podem adiar ou trocar alguma quimioterapia, por exemplo”, destaca Dr. Amorim.
Em relação ao tratamento do câncer metastático, o oncologista lembra que as diretrizes internacionais apontam que a quimioterapia oral é uma ferramenta muito útil e importante no momento da pandemia. Isso porque é uma solução que proporciona comodidade aos pacientes com menor necessidade de mobilidade urbana.
No último mês de abril, a Revista da Associação Médica Brasileira (RAMB) publicou o documento Prática oncológica durante a pandemia de COVID-19: uma resposta rápida é a melhor resposta; em que recomenda, quando possível para pacientes selecionados, a troca de medicações intravenosas por medicações orais, como a vinorelbina oral, anticoagulantes e outros.
A vinorelbina oral é indicada para o câncer de mama e de pulmão metastáticos, sendo coberta pelos planos de saúde, além de estar disponível em muitos hospitais públicos. “Você pode prescrever a vinorelbina oral ao invés de uma quimioterapia venosa. Assim, evitando que o paciente tenha que sair de casa toda semana, sentar-se em uma clínica oncológica, esperar ser atendido, talvez tenha que pegar um transporte público para ir fazer o tratamento. Mas se ele está tomando um remédio em casa é interessante. Quando precisar, ele pode fazer um exame de sangue perto de casa ou até chamar o laboratório, se possível. Com isso, o paciente pode passar pela consulta médica em um intervalo maior”, explica o oncologista.
As sociedades médicas oncológicas também citam que a escolha de terapias com menor toxicidade pode fazer a diferença durante a pandemia. O documento da SBOC informa que esquemas com menor risco de toxicidade gastrointestinal ou neutropenia febril (febre associada ao baixo nível de neutrófilos no sangue) e, consequente, menor risco de hospitalização são favorecidos. Assim, visando evitar sobrecarga do sistema de saúde e risco de exposição individual.
Assim, Dr. Amorim lembra que os médicos devem considerar os possíveis eventos adversos na escolha e revisão dos tratamentos; diminuindo as chances de queda da imunidade, que pode levar o paciente a buscar atendimentos de emergência para situações como diarreia aguda e febre, por exemplo. “Se eu tenho uma droga que tem alta incidência de diarreia, pode acontecer do paciente desidratar e precisar ir à uma emergência para tomar soro, desse modo, expondo-se mais ao risco de contaminação pelo coronavírus”, exemplifica Dr. Amorim.
Serviços oncológicos de todo Brasil relatam que houve uma queda no número de atendimentos e exames dos pacientes. A Sociedade Brasileira de Patologia (SBP) e a SBCO já estimam que milhares de diagnósticos de câncer deixaram (ou deixarão) de serem feitos no País, desde o início da pandemia. A estimativa é de até 50 mil casos sem diagnóstico. Isso se deve a diversos fatores, como consultas e procedimentos adiados, equipes reduzidas, mas principalmente pelo receio das pessoas em saírem de casa em meio à pandemia.
Dessa forma, Dr. Gilberto Amorim lembra que é importante que os serviços públicos e privados se adequem às limitações do momento. Assim, mantendo a porta aberta e um canal de comunicação livre para que os pacientes possam acessar os serviços médicos nos casos mais urgentes; para que tratamentos não sejam suspensos ou deixem de serem iniciados ou adiados de forma indefinida; evitando a complicação do prognóstico desses pacientes. “Nem sempre o câncer espera, nem tudo é Covid-19. A pandemia vai passar, mas o preço do atraso no tratamento oncológico pode ser alto demais”, ressalta Dr. Amorim.
Fonte: SBOC